sábado, 22 de outubro de 2016

Lua negra



Acordei de um sonho assustado. Aliviado por não ser real, sorrio. 
Direciono a mão para o outro lado da cama a fim de sentir a pele quente dela e seu respirar calmo, no entanto, não a encontro em um toque. 
Verifico que o edredom se encontra frio. Deduzo então, que há tempos que se levantara.
Penso: "já que ela retorna, deve está na cozinha esquentando um pouco de leite."
Calmo, sinto o cheiro da nossa cama, "cheiro de felicidade".
Com um sorriso de canto de boca me ajeito de acordo com o calor do edredom.
Então fecho os olhos com a certeza que em pouco tempo ouviria o bipe do microondas
indicando 45 segundos suficientes pra aquecer um copo de leite;
Ela o beberia, em seguida, eu ouviria o doce barulho dos seus chinelos vindo a mim;
perceberia a deformação da cama ao sentar-se;
arrepiado, eu sentiria aquele velho toque no ombro e aquela voz mascada sussurrando: Amor! aquela voz doce sussurrando: Amor! 

Passa-se mais de um minuto e aquele silêncio.
Decido então surpreendê-la na cozinha ao certo a preparar um sanduíche.
Levanto-me, a
 brisa da madrugada, estranhamente, me corta o coração. 
Entre calafrios, caminho angustiado; era como se eu tivesse perdido o calor que ela me proporcionava. 
Verifico que não esteve na cozinha, pois todos os utensílios estavam no mesmo lugar.
Direciono-me a sala, um vento forte joga-me para outro mundo;
Porta entre aberta, tapete deformado em ondas, fato que ela odiava.
Nessa hora, não me encontro mais em mim; um silêncio filho da puta me assola.
Penso no dia que ela preparara uma pizza e
comprara uma toalha com estampa de rosas e caramujos e, eu,
Desajeitado, deito uma xícara de café manchando-a,  
e ela, linda, sensata, apenas dissera: "Bobagem, a gente limpa depois"! 
Pensei nas vezes que ela me dissera palavras bonitas
e eu, pensando em como passar a sensibilidade da poesia aos meus alunos, não a ouvi.
Enquanto atravesso a sala, vejo os seus diplomas, títulos, uma vida de esforço.
Quanta força de vontade! Quantos sonhos, todos realizáveis - e eu, vivendo no mundo da lua.
Senão fosse ela que me puxasse pro chão, talvez essa hora, já pouco existia de mim.
Eis que desliza uma lágrima pelos relevos do meu rosto, lágrima fria, como a dor que sentia.
Um filme passa em minha cabeça:  penso nas vezes que deixei de dizê-la eu te amo,
agora tinha uma dívida de 54.750 "eu te amo"
Deus! Aquela vida, aqueles olhos, aqueles lábios tão meus, tão nosso!
Quantos sorrisos eu não a arranquei com uma piada tosca em um dia triste.  
E se eu não visse mais aqueles olhos negros?
Ao chegar à porta, o nosso gato, nomeado por ela de Caramujo me esquenta as pernas com seu pelo macio. Ao atravessar as dimensões da casa, o paraíso:  lá se encontrava ela olhando pra lua;
linda, viva, de baby doll preto, pernas roliças, cabelos longos, cor de noite. 

A lua enorme, partes cor de ouro, partes cor de prata, combinação perfeita com minha amada.
Então entendi que dormir aquela madrugada era desperdício.
Aproximo-me, enlaço minhas mãos em sua fina cintura, sinto o cheiro de seus cabelos, e, suavemente, levo às mãos até seus seios quentes e firmes. 

Eis que ali, palavras não nos servem mais pra descrever felicidade. 



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