quarta-feira, 31 de maio de 2017

Eu preciso falar sobre o verão de 1993 Capítulo I

 #EuPrecisoFalarSobreOVerãoDe1993 é baseado na amizade entre minhas irmãs e um fato de violência que aconteceu com elas que me foi revelado anos depois. Escrevi primeiro como uma forma de homenagem, pois uma delas faleceu em 2012, mas depois fui percebendo que muito além de uma boa narrativa, o livro escancara o machismo nosso de cada dia que pode acarretar em sérias consequências. 








Eu tinha doze anos, gostava de short-saia, chocolate do Fofão e da minha coleção de gibis da turma da Mônica, embora por vergonha não os lesse mais. Eu sonhava em ser Paquita da Xuxa, e era apaixonada pelo Fábio Júnior; não pelas músicas, era aquele charme que ele tinha ao mexer nos cabelos, que me encantava.

Eu tinha duas amigas inseparáveis; minha irmã, um ano mais velha que eu, e a minha vizinha Tati, de catorze anos. Passávamos tanto tempo juntas que a imagem de uma já estava atrelada a da outra.

Aos fins de tarde, nos sentávamos na calçada de frente para a rua e imaginávamos que todos os que vinham da esquerda eram namorados de Tati e os que vinham da direita eram namorados de minha irmã. Se fosse uma encruzilhada, talvez me sobrasse uns namorados também, mas eu não me importava. Quando surgia alguém feio, ríamos e caçoávamos uma da outra, como se realmente o casamento com aqueles passantes fosse para dali a duas semanas. Era muito divertido! Se tinha uma coisa que fazíamos bem, era gritar e rir por qualquer coisa, menos quando uma das três amargava uma paixão platônica por um professor ou por um ator da novela das seis, aí, chorávamos juntas.

Dezessete de fevereiro de 1993. Tati havia arranjado uma paquera e precisava de ajuda para um esquema marcado para as oito e meia da noite, na discoteca da minha rua. Usamos a desculpa máster e infalível: Tati iria dormir na nossa casa, e o ”intuito” era fazermos juntas o dever de casa. Duvido que alguém tenha inventado, ou melhor, duvido que alguém invente algo mais divertido que a melhor amiga dormir na casa da gente. A gente conversa a noite toda sobre amores eternos, garotos e ... é só sobre isso mesmo. Até que uma cochila, e a outra pergunta: “já dormiu? ” e ouve a resposta: “claro que não, pensando o quê?". “Viram o Jeferson hoje? Tava um gato! ” E, assim, a noite se vai sem que a gente perceba. É experimentar o paraíso.

Naquela noite, jantamos juntas, nos maquiamos, e tiramos a maquiagem. Não podíamos sair à rua maquiadas, pois nossos pais desconfiariam de alguma coisa. Deixamos somente um batom vermelho, nada discreto, e saímos, na surdina. Meus pais confiavam muito na gente, sabiam que nunca íamos longe tinham consciência que jamais entraríamos na discoteca. Não tínhamos, mesmo, a intenção de entrar; o esquema seria do lado de fora. 

Oito e meia, nada da paquera de Tati aparecer. Nove horas. Nove e meia. Quase dez horas, e nada dele chegar. Estávamos, a poucos metros de casa e da discoteca, as três magricelas de batom vermelho, decepcionadas com o bolo que Tati tinha levado. Prestes a voltarmos para casa, um carro brilhante se aproximou e quatro jovens bonitos desceram, nos convidando para dar uma volta. Eu logo disse que não ia, minha irmã também relutou; então Tati, com o coração partido, não pensou duas vezes e entrou no carro. Para não a deixar sozinha, também entramos.

O carro saiu em disparada e Tati gritava feito uma louca, enquanto eu me mantinha apreensiva, pensando na surra que iríamos levar quando voltássemos para casa. Após algum tempo, um dos rapazes, muito alegre e com a respiração ofegante, coloca uma cerveja gelada entre minhas pernas e, fazendo movimentos estranhos e repetitivos, me beija. Eu não tive reação, estava com estranhos e não podia sequer me mexer. O carro parou depois de mais ou menos meia hora, me levando a crer que aquele pesadelo tinha acabado. Mas ali não era a nossa rua. Era um terreno baldio, estranhamente distante de tudo que eu conhecia. Fiquei no carro com um dos jovens e minha irmã e Tati foram arrancadas à força e colocadas no capô, pelos outros três. Não conseguiríamos gritar nem se pudéssemos, pois, a todo momento eles diziam que, se gritássemos, nos matariam.

Depois de uma ou duas horas, não sei bem, acordei; talvez naquele mesmo terreno, e com os meus próprios cabelos na boca. Quando consegui abrir os olhos, notei Tati desfalecida sobre minhas pernas. Meu mundo desabou pela décima vez, naquela noite. Mexi em seus ombros, mas ela não reagia. Empurrei seu corpo com a força que me restava e consegui virá-la, aí... vi seu rosto desfigurado e seus olhos sem vida. Tentei chorar, não tinha lágrimas. Tentei gritar, não tinha voz. Tentei ressuscitá-la, mas foi inútil. Olhei para o lado a fim de averiguar onde se encontrava minha irmã, e a vi: estava sem roupas, sentada um pouco distante, com a cabeça entre as pernas. Parecia chorar, e segurava algo em uma das mãos. 

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