domingo, 24 de setembro de 2017

Believe



A razão nunca levou o homem ao impossível.
Se quiseres ir longe, destitui-se das sanidades, reveste-se das loucuras, e que gritem, que caçoem, que desacreditem, que lhe arranquem os cílios, os dentes,
no fim, tu ainda rirá de muita gente:
Ou porque conseguiu e pode olhar a todos de frente ou por pura loucura mesmo; louco rir de tudo abertamente.

Se tu desejas ir longe, desvia-te do caminho seguido por outros;
Constrói o teu próprio traçado; será mais árduo, mais louco, mas tesouro de caminho repetido, já foi conquistado por outros;
Então caminhe sozinho, abra florestas, desenrole teu arco-íris, e estejas ciente que, no final, não encontrarás o pote de ouro.
Tu tens que juntar pedra por pedra, semente por semente e, findada a tua jornada, terás o teu tesouro e ele será constituído de gente.

Se desejas mesmo alcançar o teu impossível, não temas o ridículo;
incomode, irrite, chateie, seja quente e não morno.
Descabele-se em público, sangre, sue, tire a roupa; a arte requer homens e não robôs treinados a moda da corte.

Lança fora as fórmulas, os manuais, os mapas...
Qualquer coisa pronta só te levará aos sonhos dos outros.
Tu és único e sabe que a fórmula é
ser louco o suficiente pra, apesar de tudo, sempre seguir...
No futuro, distante ou longe, vivo ou morto,
tu olharás para teus amigos e inimigos e dirá: eu consegui porque fui suficientemente louco pra nunca desistir.

E tu?





quinta-feira, 14 de setembro de 2017

5 filmes pra te inspirar enquanto escritor


Enquanto escritor eu busco assistir tudo relacionado a literatura, e como sou apaixonado pela sétima arte, busco  sempre filmes sobre escritores ou relacionados. Tais filmes me inspiram, fomentam meus sacrifícios e batalhas e me divertem. Faço aqui uma pequena lista dos filmes que eu julgo que são essenciais pra todo escritor assistir. Não me aterei as sinopses, contarei minhas experiências, pois indicação nenhuma supera a experiência própria com qualquer coisa.

O filme tá completo no Youtube 

Fome sult (1966)

Diretor: Henning Carlsen






Fome é um filme que retrata um escritor numa cidade estranha tentando ganhar fama e dinheiro. No entanto, como nunca é fácil, ele passa por inúmeras dificuldades. Embora sem pesquisa, acho que ele foi inspirado nas ilusões perdidas de Balzac. Os filmes antigos são os melhores por conta que passam a humanidade na sua forma mais pura, mais realista, sem os enfeites dramáticos de hoje em dia. Fome não vai poupá-lo quanto a realidade da fome.   

O que me intrigou mais no filme e o que mais me inspirou, foi o fato do personagem conseguir dinheiro de outras formas que não com sua literatura, e ele não aceitar, como se aquele dinheiro não fosse justo. Relacionei isto com a minha vida e fez muito sentido. Como nunca ganhei dinheiro algum com a minha literatura, todo o dinheiro ganho por outros meios, eu não considero justo, portanto, gasto com futilidades. Dependendo do ponto de vista, o filme pode fomentar suas irresponsabilidades, ou fazê-lo se compreender enquanto pessoa. Eu ainda estou decidindo qual lição tirar dele. No mais, Fome me encantou demais e me fez compreender que todos passam por dificuldades.



Animais noturnos (2016) 

Diretor:Tom Ford 


Animais noturnos vai dar um nó na tua cabeça, mas um nó gostoso de desenrolar. Após o final eu fiquei uns três minutos refletindo pra entender. Mas depois que entendi, que sensação maravilhosa. 

Este filme, meus queridos, é um deleite, pois ele mostra como a literatura, muito mais do que um meio de entretenimento, você enquanto escritor pode usá-la pra atingir as pessoas, tanto para o bem como para o mal. Sempre usei minha literatura pra expurgar meus demônios, me vingar, mandar recados, então esse filme só me fez entender que eu não sou mal, sou somente um escritor. 
Julguei esse filme bem o estilo de Tarentino, só que sem o sangue. Vale muito a pena. 

O segredo dos seus olhos(2010) 

Diretor: Juan José Campanella



Que filme incrível! Já vi pelo menos umas dez vezes e não me canso. 
É um filme argentino que levou o Oscar de melhor filme estrangeiro e com todo mérito. 
A primeira vez que assisti, fiquei somente ligado a história, depois que vi a segunda vez foi que comecei notar os detalhes técnicos. O filme é como se fosse inteiro um quadro no estilo cubista, pois os personagens nunca estão no centro do plano. Dá até um pouco de aflição, pois raramente você vê inteiramente as pessoas, só narizes, rostos cortados em diversos planos, o que é genial.

Ah, esse também vai fazer você ficar pensando alguns dias sobre o enrendo. Prepare-se pra sensações incríveis. Truman Capote se vivo, ficaria invejado de não ter contado essa história, se fosse ela real.
É um filme que é literatura pura.  





A Janela secreta(2004)

Direção: David Koepp





Inspirado  na obra de Stephen King e estrelado por Johnny Depp, Janela secreta narra a loucura que pode desencadear a sua obsessão por qualquer coisa. 

Eu gosto de literatura, vivo a literatura, mas apenas no plano surreal, embora ela acabe reverberando também no plano real, mas com as pessoas com que convivo eu não falo em nada relacionado a literatura. Na verdade quase ninguém sabe que sou escritor no meu mundo real.  

Agora no plano cibernético, transcendental, eu levo a sério mesmo e não tenho escrúpulos; uso mesmo as pessoas, mas faço questão que elas não saibam. Não mais. 
Eu cometi esse erro com meu primeiro livro publicado e acabei perdendo todos os meus amigos, logo, foi uma lição e tanto, então, embora escreva sobre as pessoas de meu convívio, faço questão que eles não saibam. Janela Secreta é um filme que todo escritor louco como eu e você, julga perfeitamente possível, portanto, que tomemos cuidado. Se você tem indícios de esquizofrenia como eu, mais uma vez, cuidado!  




Forrest Gump(1994)

Diretor: Robert Zemeckis


"Run Forrest! Run! Corre Forraest! Corre!" Essa frase reverbera na minha cabeça desde a primeira vez que assisti Forrest Gump.  
Como eu queria que tivesse alguém que gritasse bem alto pra que eu seguisse em frente todas as vezes que alguma dificuldade me surgisse. 

Oliver Cramwell disse que nenhum homem chega tão longe quanto aquele que ignora sua jornada. 
Ora, quem ignora o caminho até um objetivo se livra daquela dura decepção ao notar o tanto de tempo que leva pra se alcançar o impossível, logo, seja em qual for o tempo que atingir tal objetivo, será sempre no tempo certo. Forest Gump é um exemplo maravilhoso dessa verdade. 

Além dessas lições, você pode extrair muitas outras desse filme incrível. Ele é um ótimo exemplo de uma narração fluída, leve, mesmo tratando de temas profundos e perturbadores. 
Ah! Como eu queria um dia conseguir escrever um livro que pelo menos chegasse perto de Forrest Gump. 

Portanto, quer melhor filme pra reunir inspiração pra buscar melhorar enquanto escritor? 

Senão tiver visto, não perca tempo. 



sábado, 9 de setembro de 2017

A esquizofrenia dos androides

Jackson Pollock foi um pintor americano que tinha como técnica se desvencilhar dos próprios pensamentos humanos e deixar que sua natureza instintiva pintasse por ele.
Muitos, até hoje, tentam imitá-lo, mas alguém jamais conseguiu.
Foi o que tentei fazer escrevendo esse texto. Mas não foi fácil mesmo. Escrevi naquele intervalo entre o sono e o desperto, quando a gente não controla mais os pensamentos. O resultado tá ai. A arte meus caros, nunca vem fácil. É preciso sangue e carne pra alcançá-la.



Ela apeou-se de um cavalo no meio da nada.
Era deserto, meio dia, um pobre menino sujo apareceu e se lambuzaram de mel.
No dia seguinte, marcaram de se encontrar.
No parque, os pássaros azuis fervilhavam na água da fonte.
O sorvete, quase por terminado, uniu-os em um beijo.
Se era romântico, carnal, o sol quem ia dizer.
As palavras que saiam da boca dos dois eram chulas, sem requinte, mas eles se gostavam, e para os deuses bastava.
Depois de seis meses, resolveram que iam se casar.
Três dias depois, não restando muita coisa além de um namoro chato e conversas sobre coisas incomuns vindas lá das planícies do Himalaia, resolveram que iam terminar.
Eu não preciso dos desejos pra escrever; posso seguir em qualquer direção e minha carruagem esbarrar em vacas dos sertões - e os bifes que delas saírem me alimentarão daqui seiscentos anos.
Pensei agora na Ana, colega da faculdade, lembro dos grandes olhos dela - e o resto, pouco importa. Mas eu poderia, sei lá, tentar qualquer coisa. Mas e o amor da minha vida?
Ela notou que sou doente, raquítico e estarei morto daqui seis meses.
Talvez eu nem me importasse com o embaraço, porque eu queria mesmo era conhecer alguém que tivesse como ofício cuidar de gatos siameses.
Isso nunca vai parar, não é? - Não.
O tempo é uma engrenagem que vai pra frente sempre.
Minha vida tá tão estagnada que dá pra pensar que eu vou explodir e meus restos não serão purpurina.
Ah, como se desvencilhar dos desejos?
Era preciso pensar em outra coisa e escrever outra.
Ora, o sol do meio dia mesmo sem saber pra onde vai, não se esconde mesmo assim?
Minhas esmolas nunca dadas, permanecerão aqui.
Meus guarda-chuvas pouparão joaninhas da saudade dos androides de 1982.
Procuro meu sorriso a cada manhã, mas ele ficou lá na curva asfaltada daquela viela.
Minha solidão, meus devaneios, se envaidecem com os olhos da menina de vestido verde que pouco sorrir, que pouco ama, mas que samba na Quatorze de janeiro.
Se eu pudesse inventar qualquer coisa, criaria os ventos pra que levassem os barcos a velas que desenhei no papel pra longe das aquarelas que não inventei.
Nem mesmo sei se a garota do vestido verde ainda samba, mas os seus olhos ainda me encantam.
Ah! Ela é  insensível como rosas de porcelana.
Eu sou poeta, rimo sem querer. Que maravilha!
A saudade é coisa que não se esconde em trincheiras.
A guerra, tema sublime pra romances, não se encontra em imãs de geladeiras.
Me soa pobre, mas eu nunca fui mesmo um grande cavalheiro.
Nunca juntei chapéus de teresinhas que foram a queda foram ao chão.
Vamos poeta, deixe que as palavras surjam sozinhas.
As rezinas dos cajueiros guardam insetos dos tempos dos dinossauros
e eu nem pra guardar os broches que seguraram minhas fraldas.
Eu só guardo lembranças e loucuras.
Na verdade, guardo também uma carta perfumada que tá lá na gaveta do criado mudo.
Se eu tivesse que ir pro mar, iria bêbado - e se voltasse, seria com as espinhas do peixe de Hemingway.
Se eu fosse a um baile de formatura, seria eu quem derramaria o sangue na Carrie.
Ou talvez eu fosse mesmo era o porco de que tiraram o sangue.
Sei lá, o casal, depois de uma semana, voltaram.
No futuro, eles terão três filhos rudes tanto quanto eles.
São burros feito pedras, mas é destino deles povoarem a terra.
Tudo rima, mesmo que eu não quisesse.
Que dom! Que dom meus velhos.
Ah! meus amigos, ah meus inimigos,
no futuro, quando aqui não mais estiveres
desenvolverão teses sobre tudo que fizeram,
mas será tarde, já estarão apagadas vossas velas.
"Ah! meus amigos, ah! meus inimigos"
aproveitem enquanto eu ainda brilho,
pois não durarei a noite inteira aqui de sentinela.

quinta-feira, 7 de setembro de 2017

Toda filosofia antes de Darwin é inútil



Seguindo a tendência, resolvi contestar toda a filosofia de Kant tendo lido somente as três primeiras páginas do livro Fundamentação da metafisica dos costumes. Na verdade, toda filosofia já produzida desde os primórdios da humanidade. (Risos) 

Kant nos diz no livro, que se a felicidade dependesse do instinto, uma vez que a natureza inclina-se sempre ao bem estar do indivíduo, a razão se imiscuiria ao instinto e este, por sua vez, prevaleceria sobre a razão. Kant então conclui que o propósito da razão não é a felicidade em si, mas sim o discernimento para escolher atos de boa vontade, que no amplo sentindo, proporciona o bem estar e uma consequente felicidade ao homem. 
Pensando assim, com a razão suprimida pelo instinto, como diz Kant, todos seriam felizes somente por existir. A razão então seria algo sublime e elevado, e não levaria aos que a estudam a desenvolver até mesmo ódio por ela. Kant usa mesmo a palavra ódio, porque sabia que qualquer um que pensasse bem chegaria a conclusão que o livre arbítrio é um martírio. Ter que escolher, buscar entender o outro e a si, e diversas outros questionamentos oriundos da racionalidade não condiz com felicidade. 

Alguns pontos importantes levaram Kant e outros grandes filósofos a produzirem uma filosofia, por muitos vista como profunda, superficial demais e pouco pragmática. 
Primeiro ponto é que desconsideraram a origem da razão e a isolaram do instinto. A racionalidade surgiu daquele instinto de "antecipar o perigo" de modo a garantir a sobrevivência do indivíduo. Ou seja, a razão surgiu do medo. Aos poucos, os homens foram desenvolvendo a capacidade de antecipar o perigo cada vez mais a frente, e esta habilidade, como sendo favorável pra sobrevivência, foi sendo passada ao longo das gerações, ou pool genético, para os biólogos. 

Se deseja saber como elevamos essa habilidade que tantos outros animais possuem ao ponto de adquirirmos a consciência de nós mesmos, você precisa ler o artigo da pesquisadora Suzana Herculano Hoezel, em que ela conta os neurônios do ser humano e suas hipóteses a respeito de como chegamos a racionalidade. Ou veja no Youtube sua participação no programa TED.  

Conclui-se então que a racionalidade, nada mais é do que uma estratégia de sobrevivência como qualquer outra que, está sim, inteiramente ligada ao instinto. E se você parar pra "pensar" 99,9% dos homens seguem somente seus instintos naturais, se reproduzindo e povoando a terra, pensando somente em garantir o sustento da sua prole, sem se questionarem sobre a razão de qualquer coisa. E estes, pode-se dizer que são aqueles que são de fato felizes. 
Ou seja, a natureza escolheu sim o instinto em detrimento da razão. Se assim não fosse, o homem seria minoria na terra, porque quem pensa não se reproduz. Basta que você que está lendo e compreendendo isso, verifique quantos filhos tem. 
Logo, o único objetivo do homem e de qualquer ser vivo é a sobrevivência até o ponto de que o indivíduo passe os seus genes adiante, isto, independente da felicidade ou da consciência dela. E o propósito da razão é o mesmo que das demais estratégias: garantir que isso ocorra. Assim sendo, todo costume oriundo da razão, converge também para este mesmo fim. 

Para que se produza qualquer filosofia útil e que faça sentido, ela precisa de início, ser pautada no instinto, onde somos menos racionais. 

Se Kant, Hegel, tivesse se pautado no instinto e não no espirito, nós já teríamos uma compreensão maior de quem somos. O instinto, a vida, com seus objetivos inconscientes, é o início de tudo, inclusive dos costumes e de toda metafísica. Qualquer um que desconsiderar isso, vai somente produzir uma filosofia para poucos, ou como dizem, de difícil compreensão, simplesmente porque é falha. Quem chegou mais perto dessa compreensão foi Nietzsche, pois levou muito em consideração o trabalho de Darwim. Bem, não podemos culpar nenhum filosófico que viveu antes da publicação da Origem das especies por essa falha.  

A filosofia pensada assim, mais parece biologia, no entanto, a metafisica se pautada primeiro no instinto, nos levaria a uma compreensão real de quem somos. Mas não pense que nos compreender intimamente é algo bom e que vai nos proporcionar felicidade. Muito pelo contrário. Basta ver que este texto lhe provocou mais ódio e inquietação do que felicidade e bem estar. 

Não negues, não mintas, eu sinto! 

terça-feira, 5 de setembro de 2017

Víbora



14 anos, olhos grandes, cabelos negros e uma ganância feroz que lhe acompanhava subentendida em cada sorriso, em cada piscar de olhos, em cada rebolado que desferia propositadamente nas faces dos bobos enquanto caminhava. Não se sabia se aquela ambição lhe era natural ou imposta, mas que ela queria se dar ao mundo e em troca receber o mundo de volta, isso ela queria. 
Inquieta, aquela aparente menina meiga, nunca se dava por satisfeita; ela queria andar, conhecer, viver... É certo que todo adolescente necessita gastar as energias oriundas dos hormônios à flor da pele típicos da idade, mas ela era tal qual animal no cio que caminha horas a fio a procura de parceiros sexuais. Dizia-se que tal inquietude era devido as inúmeras cervejas que a mãe tomara enquanto estava grávida dela. Eu não sei!  Sei que, justificada pela ganância, várias outras malícias foi sendo aos poucos desenvolvida naquela garota inegavelmente bela e perigosa. Sem escrúpulos, ela pisava, sugava e iludia aqueles coitados que se deixavam levar por seus encantos, e acreditem, como eram tantos...  

Apesar de jovem, ela era mestre na arte da mentira. E como mentia aquela menina! Talvez exatamente por influência dos pais, ou porque a ensinaram mentir, ou porque se deixavam acreditar em suas falácias, lhe dando assim margem pra continuar no erro. Se ontem ela havia ido pra uma missa na cidade vizinha; hoje tinha um aniversário da filha recém-nascida de uma amiga sabe-se lá onde; amanhã teria que inventar um batizado, um casamento, qualquer desculpa bem elaborada para os pais fingirem que se importavam com suas saídas diárias. Talvez suas mentiras se devessem às oportunidades, pois o que não faltavam eram homens pobres, ricos, novos, velhos, lhe ofertando praias, celulares, joias e jantares em troca de algumas horas da sua companhia, assim, não lhe faltavam opções. Mas esses homens só ganhavam mesmo seus sorrisos poucos sinceros, seus olhares de soslaio, suas cruzadas de pernas de minissaia, e a exibição de uma menina linda e nova em algum restaurante caro e nada mais. Ora, ela sabia que guardava um tesouro valioso que a partir do momento que o primeiro tocasse, perderia gradativamente o valor. Assim sendo, ela o mantinha a sete chaves, embora aos mesmos custos do vulcão ao tentar conter as lavas antes da erupção. 

Naquela vida, cedo ou mais cedo ainda, era sabido que o seu tesouro seria resgatado, ou entregue a alguém, portanto, ela foi instruída que tomasse precaução de pelo menos entregá-lo para alguém de posses. "É melhor que encontre uma árvore que te proporcione sombra". - Escutava ela essa frase dos próprios pais quase que diariamente.  Não julgo-os, é natural do homem querer garantir segurança e conforto as futuras gerações. 

Com essas malícias, ela matava á unhas coloridas uns e outros, sempre fingindo para aquele que lhe fazia companhia no momento que não havia mais ninguém na sua vida. Porém, sabendo esses outros que sempre existiam outros, se matavam de ciúmes e, por conseguinte, elevavam seus esforços a estratosfera para mantê-la por perto. E ela sabendo disso, sorria como quem tudo queria; fingia que sentia ciúmes de todos, ou talvez possessiva, nem precisasse fingir, o que a tornava a mais bela víbora do deserto. Ela mantinha aqueles homens competindo por ela como uma cadela no cio que deixa os machos brigarem entre si para, no final, escolher o vitorioso. Não a julgo por isso, ela só estava sendo humana.

Ora, astuta, ela sabia que tinha todos nas mãos e que bastava um piscar de olhos pra que eles lhe trouxessem refresco e uvas à boca. E ninguém, por mais bruto que fosse, conseguia feri-la, nem mesmo com golpes de vestidos de seda. Ah, ela tinha o trejeito natural ou ensinado de ganhar os homens e moldá-los a sua maneira. E como ela usava tais habilidades... Seu único defeito era a pouca idade e consequentemente os hormônios que carregava no corpo, pois uma hora ou outra, era certo que algum homem experiente iria usar  o seu tesouro. Era só questão de sorte, ou azar de quem estivesse com ela no momento que as lavas do seu tesouro entrasse em erupção, pois não importaria as instruções, os sábios mantras, ela certamente o entregaria a um mendigo, se ele estivesse por perto. Sabendo disso, todos que conviviam com ela, torciam, recorriam a simpatias, sacrificavam cordeiros, rezavam e imploram aos céus pra que fossem eles e não outro a ter essa sorte, ou como disse, azar.

Porém, tanto esforço em manter seu tesouro seguro foi por água a baixo quando um colega da turma da escola foi fazer um trabalho na casa dela ás nove da manhã em um dia que seus pais deixaram-na sozinha. Que desgraçado! 

segunda-feira, 4 de setembro de 2017

Torto





Amar a mim? Não aconselho!
Sou inconstante, temperamental,
Desvairado, volúvel;
Eu posso amar-te em segundos sem razão nenhuma,
E posso odiá-la horas,
Mesmo que me dê todas as razões para amá-la.
E sou daqueles egoístas cujos
se importam apenas com as próprias razões.

Amar a mim? Não, não devia.
Eu não sigo a ordem dos demais no espaço,
Tão pouco no tempo;
Posso entregar-te flores em datas comuns
E esquecer de propósito dias importantes.
Posso viver de futuro, de esperanças,
E morrer de presente, por mais belo que se apresente.

Não! Amar a mim, terrível ideia.
Não compreenderia;
Posso acordar para ouvir as cores dos pássaros
nas noites de lua.
Vê que loucura?
Posso querer correr na chuva em direção alguma.
Posso querer passar horas a vislumbrar
Joaninhas em um tronco qualquer
Pois elas me trazem lembranças
de momentos que não vivi.
Vê que loucura?

Amar a mim? Não, não devia mesmo.
Eu sou fraco, medroso,
Precisaria que tivesse coragem por dois.
E vivo de sonhos; sou um sonhador.
Crio o meu próprio mundo e o resto que se exploda!
Sem contar que carrego a pior das moléstias:
Sou um romântico demasiadamente racional.
E ainda há o mais grave: eu imagino.
Não queira amar alguém que imagina!




domingo, 3 de setembro de 2017

Revelação




Desde que se entendera por gente, aquele menino se deu conta de uma centelha azul que carregava no peito que lhe conferia uma certeza: ele havia nascido para algo grande. Não sabia o que era, mas tinha como certo que iria chegar tão longe quanto ele próprio jamais supusera.

De origem humilde, tudo que ele podia sonhar aos moldes de sua realidade era conseguir alguns metros de terra pra arar e manter um rebanho de cabras, isso, se sonhasse alto. Se tivesse mesmo que imaginar o impossível, ele poderia sonhar em ampliar o rebanho e comprar mais alguns alqueires de terra. Ora, saindo do nada, um homem que conseguisse tamanhas conquistas já seria grandioso.
Mas o problema era aquela bendita ou maldita centelha no seu peito que lhe repetia sem cessar:
"Tu nasceste para algo grande! Não se conforme com a ordem que a vida lhe conferiu!"

Apesar das certezas, tudo lhe parecia muito vago. Aquele sonhador procurava em si algum talento especial, uma habilidade física, uma afinidade para as contas, um timbre para ópera, ou mesmo mãos hábeis para a pintura, mas nada lhe ocorria além das dúvidas. E a vida pressionando o tempo todo pra que ele se entregasse a ordem e começasse lutar por aqueles sonhos que ele sabia que não eram dele.
Por um tempo, a miséria e as dores ao longo da vida o fizeram mesmo se entregar, ao menos pra manter as futilidades da juventude. E a centelha lá, no lugar de sempre - e no fundo - era ela que o mantinha de pé, que lhe dava forças pra continuar naqueles empregos que detestava, pois tinha como certo que não iria precisar ficar ali pra sempre, pois "grandes coisas estavam por vir". Pelo menos era o que ele acreditava. Era como viver segurando uma bomba relógio sem ter a chance de olhar o marcador.

Ele refletia que aquela centelha devesse ser um pouco mais clara e lhe mostrar logo qual era a sua grande habilidade que o levaria ao topo do mundo. No entanto, lhe ocorria que talvez seu talento fosse de atirador de elite, mas como jamais vira uma arma, ele poderia passar a vida sem se descobrir devido à falta das ferramentas certas. O seu talento poderia ser, na verdade, qualquer coisa, mas vivendo na roça, as chances dele se deparar com as ferramentas pra descobrir a si mesmo eram mínimas.

Sonhador irremediável, ele seguia conformado com a lama do seu presente se baseando nos louros do futuro. Ele sabia que tudo lhe seria revelado, como num passe de mágica mesmo: em um dia iluminado, sem que ele buscasse, um anjo do céu, um alien, um andarilho com a missão de lhe revelar a sua missão grandiosa, olharia nos seus olhos castanhos de tão comuns e diria: filho, tu nasceste com a missão especial de... Qualquer coisa que ele ainda não cogitava o que era.
Enquanto isso, o tempo passava sem parar e a vida lhe sacudindo pra onde bem entendesse. E ele suportando tudo calado. Até que, depois dos vinte anos, embora a centelha ainda estivesse lá em algum lugar, já perdia quase que completamente o brilho. Pensou ele que o combustível para manter aquela centelha azul acesa era os hormônios da adolescência, e o tempo estava naturalmente apagando ela. Por não ser mais tão jovem, ele já se dava conta que talvez não tivesse nascido mesmo pra nada grandioso.

Aquela altura, ele tinha largado os estudos pra trabalhar, mas descobriu com o tempo que, com certeza, a sua habilidade especial não era pra arar a terra, muito menos pra ordenhar cabras.
Ao lhe ser revelado isto, ele desistiu dos trabalhos manuais e resolveu voltar a estudar aos 21 anos. Nesta época, da antiga centelha só existia mais uma fina fumaça cuja evidenciava que um dia ela estivera acesa.

Eis que, enquanto concluía o ensino médio, numa aula qualquer, por impulso, aquele sonhador destratou uma professora de Português ao tal ponto que as lágrimas molharam as suas faces rosadas. Aquele jovem burro, porém, não suportou ser a razão das lágrimas de uma mulher. Era preciso se redimir. 
Em outra aula,  a mesma professora resolve delegar aos alunos a tarefa de escrever um texto com tema livre. Era a chance daquele sonhador de se redimir e mostrar que, no íntimo, ele não era o idiota do triste episódio anterior. Foi assim que, entusiasmado, ele descreveu o amor no papel pela primeira vez. Mas não na forma abstrata, ele se utilizou das características reais de uma moça que encontrou no corredor, de modo que foi até fácil.

Depois de uns dias, a professora retornou com o texto e lhe disse às palavras que mudaram a sua vida: "Eu não sabia que você era assim! Você demonstrou neste texto uma sensibilidade que não condiz com a personalidade que você emana para o mundo”.
Foi assim que ele concluiu:
- Então é isso! Eu sou escritor! 
Mas não pode ser?! Eu odeio ler!

Mesmo odiando a leitura e sem ter lido um único livro por completo até então, aquele jovem sonhador se descobriu escritor.

Agora só precisava escrever algo sublime e maravilhoso de modo a se tornar o grande escritor o qual ele acreditava estar destinado! Mas o quê?



sexta-feira, 1 de setembro de 2017

Vale da sombra




Eu nunca mais escrevi nada, talvez porque esteja vivendo demais e não me sobra tempo pra reflexões.
Só que nessa de viver tenho me sentido vazio também,
mas não aquele vazio existencialista que me inspirava no passado.
Agora é um oco comum, sem elegância, sem saudade, perspicácia, ou mesmo desejo de liberdade.
Só quero ir pra frente, sem objetivos grandiosos ou corridas incansáveis atrás de sonhos impossíveis.
Ora, os meus sonhos estão aí: os desenvolvi, criei as mais variadas estratégias pra buscá-los, mas parece que eles vão correr mais do que eu sempre.

Estou me tornando finalmente, feliz ou infelizmente, mais um daqueles que caminha pelos dias resolvendo um problema de cada vez a medida que eles surgem.
Ando me dedicando a faculdade e pensando no futuro de poucos dias a frente, sem perceber a pequeneza das coisas que me vem à mente.
Tenho pensado que me bastaria um emprego fixo, de professor, que seja; uma casa simples, uma boa esposa e nada pra trás.
Nem mesmo me importo se ficar com o grande amor da minha vida.
Hum, "amor da minha vida!" Isso é coisa de adolescente!
Não. Pode ser qualquer uma, desde que morena e que carregue um sorriso de primavera. Nem isso também, pode ser uma fada dos confins da terra média.
Notem que esse texto é uma tentativa frustrada pra recuperar a fé no meu talento por ora enfraquecido.
Mas talvez eu seja como o violinista de Dostoiévski e criei a consciência da minha falta de talento pra justificar o meu fracasso.
A verdade é que eu já nem sei de muita coisa. Ando meio burro!
Ò céus, estarei eu caminhando no vale da sombra da normalidade e de tonto não percebo mal algum?
Ora, eu quis por força criar o meu próprio mundo e reneguei a vida como ela é inúmeras vezes.
A verdade é que eu falhei em tudo e talvez não me reste mais tempo pra me redimir antes que o galo entoe seu canto matinal.